Amor preto: Onde tu andas?

 

Uma mistura de sensações, profundos sentimentos, confusões amorosas, certezas, desabafos, desilusões e mais, muito mais mistura de sensações, com pitadas de amor preto. Onde tu andas? é o livro da preta de quebrada, ativista, escritora e visionária Lara Fábian (@_lrfabian). A obra concentra emoções da autora, emoções essas que mergulham nas entranhas da sociedade brasileira, historicamente racista, discriminadora.

Segundo o advogado, filósofo e Professor Silvio Almeida, Racismo Estrutural (p. 279) “a consequência de práticas de discriminação direta e indireta ao longo do tempo leva a estratificação social, um fenômeno intergeracional, em que o percurso de vida de todos os membros de um grupo social, o que inclui as chances de ascensão social, de reconhecimento e de sustento material – é afetado”. Este livro fala da solidão da mulher preta, um assunto que todo mundo deve falar porque é uma das crias malignas da estrutura racista brasileira que afeta diariamente há gerações, nossas mulheres.

No capítulo amor preto, a preta faz um grande desabafo que perpassa questões sociais e amorosas. Tudo é sobre bastar-se? A melhor companhia é a de si própria? Você se bastaria nessa condição? “Eu sou de onde rejeitaram meus traços, minha cor escura parecendo o céu quando a madrugada chega (meus sentimentos estão estacionados e aqui tiro minhas vestes). Sou de onde rejeitaram meu cabelo afro, ‘abaixa esse volume’, eles diziam.” E tem mais... Lara prossegue em seu desabafo. “Cresci sendo rejeitada pelos filhos de senhores de engenho, os quais eu achava que eram os príncipes dos meus contos de fada, e que tudo seria mais fácil se eu abaixasse o volume, então eu abaixei, de nada adiantou. Fui trocada diversas vezes (muitas de nós, mulheres negras, ainda somos) pelas sinhazinhas de cabelo liso e pele clara, essa sim dava para apresentar aos pais. Maldita, negra, mulata!” Fortes relatos não é mesmo? Você, caro leitor, se bastaria nessa condição? Como?

Nesse cenário de vivência na sociedade brasileira, em que a mulher negra é preterida em gênero, raça e classe, o poder de seus valores pode surgir a qualquer momento e de qualquer lugar. Tem sempre uma preta de quebrada para lançar a letra, o passo, a ideia, o texto, a fórmula e tudo mais, especialmente o amor. E a preta experimenta o amor preto, o começo de TUDO. Em suas palavras, tudo sentira depois de amar e se decepcionar. “E eu que nunca considerei ninguém meu –porto seguro- considero-te. A partida, num outono de abril (...) nem os raios mais fortes que riscam o céu de um bairro a outro se comparariam ao meu pequeno coração partido." A preta fala como o seu -amor preto- a faz sentir numa completa mistura de sensações, perceptíveis em suas profundas palavras vindouras do coração. Sintam! Ora ”-Eu&Tu- Teu jeito sublime me encanta, tua aura positiva me faz viajar, dedico-me a ti corpo e alma e mergulho em ti sem temer me afogar. Confundo-te com meu porto seguro e estaciono meu barco nas margens do teu mar”. Outrora “-as borboletas morreram- eu lembro exatamente de quando olhava para essas árvores verdes que estão na minha frente e elas pareciam tão mais vivas, ou era por que eu estava perdidamente apaixonada por você? –Ainda me sinto mal- e isso fica tão à flor da pele que me faz chorar até doer o peito, ou me faz olhar no espelho e me perguntar se a felicidade existe, se ela é duradoura ou momentânea? Você tem noção que consegue me afetar profundamente? Me faz duvidar de quem eu sou, se estou seguindo o caminho certo, se estou em segurança. Sim, ainda me sinto insegura”. É amigos, o amor tem dessas... No começo ficamos cheios de certezas, no final, dúvidas e mais dúvidas. Você já amou como se não houvesse o amanhã? Aquele amor que quando bate a gente perde o medo da morte? Já parou para pensar como as questões de classe, gênero e raça podem implicar na experiência do amor para uma mulher preta? E já parou para pensar o que VOCÊ tem com isso? Sim, você!

Choveu!

O coração da jovem escritora agora tem gotas de solidão como as gotas de água que ficam estacionadas nos fios dos postes depois que a chuva passa, esperando que o sol ou o vento façam-nas desaparecer e tem sido assim para ela, a espera do vento a levá-la a qualquer lugar.  As vias estão fechadas, ela precisa ir embora dele, urgente!


Texto: Dai Paz, Natureza França

Edição de imagem: Adriano Alves

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