Brasil, 1890, a capoeira é criminalizada e seus praticantes penalizados perante à lei.
Brasil, 1985, o estado de São Paulo aprova a lei que cria o Dia do Capoeirista em 03 de Agosto. Brasil, 1988, a Constituição Federal diz que as datas comemorativas devem ter “alta significação para os diferentes segmentos étnicos nacionais”.
Representantes da capoeira defendem que o dia 03 de agosto não tem representação significativa para a comunidade e é uma das tentativas do mesmo estado que criminalizou, de institucionalizar a prática de luta e resistência ancestral. A gente do Favela Revela decidiu entrar na onda e comemorar o Dia do Capoeirista, já que não nos faltam referências, mas é bom não passar abatido porque que lutar nem sempre é vencer e nem todo dia se vence do lado de cá. Por isso é bom manter um pé na frente e outro atrás, como a ginga da capoeira.
Brasil, 2020, de Campinas, São Paulo, grupo Cordão de Ouro, Luiz Otávio Camilo Martins é Professor Mussum, seu corpo apresenta destreza e um jeito lindo de jogar. Ele conta que o primeiro contato com a capoeira foi aos 8 anos, o que mais tarde, reverberou fortemente em sua vida. Através da capoeira, Mussum viajou para mais de 20 países levando verdade e vivência, filosofia de vida, trabalho e lazer. “Sou o primeiro referência gay a levantar a bandeira em territórios capoeirísticos, palestro em seminários e congressos sobre questões raciais e LGBTQIA+ dentro da cultura, tenho um trabalho de capoeira para LGBT em Campinas, recebi o prêmio de personalidade do ano em apoio à comunidade LGBT (...) Tenho virado símbolo de resistência LGBTQIA+ negro dentro do território da Capoeira”.
Além da capoeira e maculelê, Mussum dança Vogue, um estilo de dança norte americana da década de 80, inspirado nas poses que as modelos faziam nas páginas da Revista Vogue.
Sobre o seu território, revelou “nasci e cresci num bairro periférico, majoritariamente negro, onde a Igreja domina, tem penitenciária e base policial. Não exclusivamente por esses fatores, mas a reprodução de racismo, machismo e LGBTfobia sempre foram fortíssimas. O apoio à cultura nunca foi dos melhores, porém os moradores sempre se aglomeram, por conta mesmo, produzindo festas comunitárias, arrumando as praças, pintando as ruas e quadras”. Velhas histórias se repetem entre a dor e a beleza das quebradas, falta o rango vez em quando, abuso de autoridade, baixa autoestima, educação e saúde precárias e a gente cresce vivendo nessa estrutura racista, tendo que aprender a “gingar” e ser “malandro” desde cedo para não tomar mais rasteiras, porque a rasteira da “desigualdade”, essa é certa. E o plano foi tão bem elaborado que todo dia, toda hora, agora, se pá, tem um preto matando outro preto, um semelhante, outro irmão. Sinto que periferia também é quilombo e se for para contar o que já vivi no morro que cresci, vai rolar um livro. Deixa quieto, vamos vencer com culturas de resistência.
Sobre Mussum, nosso homenageado #doladodecá dessa semana, é lindo ver um dos meus protagonizando, alimentando o sonho do povo no poder, através de uma história que me faz acreditar mais em mim porque me identifico com ela, e mais responsável com a capoeira que pratico aqui no grupo Nossa Arte, nas quebradas de Salvador. Como disse antes, do lado de cá, não se vence todo dia, mas quando vence um, vencemos todos e todas de alguma maneira.
Texto: Davi Bahia
Edição e revisão: Natureza França
Vídeo e Foto: Acervo pessoal Luiz Otávio Mussum

Comentários
Postar um comentário